Na versão 2009, o Delphi atualizou o core do compilador e do IDE para aceitar o padrão Unicode, em substituição ao padrão utilizado até então, o ASCII. Essa mudança fez o mapa de caracteres subir de 255 para mais de 100 mil opções, passando a comportar os caracteres de variados idiomas de todo o mundo, como chinês e russo.
Esse recurso não trouxe diferenças para grupos de desenvolvedores que lidam apenas com caracteres convencionais do nosso alfabeto, mas expandiu a possibilidade de incorporar caracteres de idiomas menos comuns dentro do código fonte das aplicações.
Entendendo o Unicode no Delphi
Antes da versão 2009, o tipo string no Delphi seguia o mesmo padrão de caracteres utilizado nas versões mais antigas do Windows, e que fazem parte de uma tabela conhecida como ASCII. Essa tabela possui os principais caracteres (visuais e não visuais) para composição de texto em sistemas computacionais.
O surgimento do padrão Unicode para Windows e Web, representado pela tabela UTF (8 ou 16), possibilitou a representação e mapeamento de todos os caracteres de idiomas existentes. Diante disso, para aceitar a criação de variáveis que atendessem a esse novo padrão, o Delphi criou o tipo WideString.
Contudo, após a versão 2009, devido à comum necessidade de internacionalização das aplicações, o Delphi adotou o WideStringcomo o tipo padrão para strings, enquanto que para representar textos com caracteres em ASCII, foi criado o padrão AnsiString.
Trabalhando com strings no Delphi
Todas as operações com strings conhecidas no Delphi se mantêm as mesmas, exceto as rotinas que trabalham com manipulação de texto em baixo nível (quando há a validação direta dos bytes que compõem a string). Isso ocorre porque os códigos que representam os caracteres nas tabelas ASCII e UTF não são necessariamente os mesmos, o que pode gerar alguns bugs em códigos que trabalhem com textos diretamente em bytes.
Na Listagem 1 temos um exemplo de concatenação de strings, contidas em variáveis, para terem seus valores exibidos em uma caixa de diálogo. Nesse código, as variáveis messageAnsi e messageUnicode foram declaradas com tipos de dados que podem comportar, respectivamente, caracteres ASCII e UTF.
procedure TForm3.Button1Click(Sender: TObject); var messageAnsi: AnsiString; messageUnicode: string; begin messageAnsi :='Atenção!'; messageUnicode :='注意'; ShowMessage(messageAnsi+#13+messageUnicode); messageAnsi:='Внимание'; messageUnicode:='Внимание'; ShowMessage(messageAnsi+#13+messageUnicode); end;
- Linha 7: Utilizamos caracteres chineses para atribuir o texto “Atenção”;
- Linhas 10 e 11: Atribuímos o texto “Atenção” em russo para as variáveis messageAnsi e mesageUnicode.
Na Figura 1 podemos ver o resultado do método ShowMessage nos dois casos. Observe que na primeira caixa de diálogo ambos os valores das variáveis são apresentados corretamente, enquanto na segunda o valor da variável messageAnsi é apresentado como “?????”. Isso ocorre porque a variável do tipo AnsiString só trabalha com o range de 255 caracteres da tabela ASCII, na qual não estão contidos os caracteres utilizados (russos, nesse caso).
Saiba mais sobre a manipulação de strings no Delphi
Melhoria no código fonte
Ao modificarem o compilador e o IDE para aceitarem o padrão Unicode, surgiu um efeito colateral que se tornou “bem-vindo”. O Delphi, por ser uma linguagem case-insensitive, não possuía tanta flexibilidade na escolha de palavras para nomear as variáveis, gerando erros de compilação em trechos como:
Cliente: cliente; String: string; Record = record;
Esse tipo de sintaxe é aceitável em qualquer linguagem case-sensitive, pois “Cliente”, iniciado com maiúsculo, é diferente de “cliente”, iniciado com minúsculo, por exemplo, mas no Delphi não há essa distinção.
Com o uso de strings Unicode no código fonte, o programador Delphi passou a contar com maior versatilidade na escolha dos nomes das variáveis, como pode ser visto no exemplo da Listagem 2.
procedure TForm3.Button2Click(Sender: TObject); var Atenção: AnsiString; 注意 : string; begin Atenção :='Atenção!'; 注意 :='Внимание'; ShowMessage(Atenção+#13+注意); end;
- Linha 3: Declaramos uma variável utilizando os caracteres “ç” e “ã”;
- Linha 4: Declaramos uma variável com caracteres chineses;
- Linhas 6 e 7: as variáveis receberam, respectivamente, a palavra “atenção” em português e russo;
- Linha 8: o método ShowMessage exibe o conteúdo das variáveis na caixa de diálogo.
Diferentemente do que se pode imaginar à primeira vista, esse código não gera erros. O compilador compreende perfeitamente que os demais caracteres são normais e podem ser utilizados para nomear variáveis, classes e instâncias. Embora a linguagem ainda seja case-insensitive, a possibilidade de utilizar ç e acentos, por exemplo, dá mais flexibilidade nos nomes escolhidos pelo desenvolvedor, desde que isso não prejudique os padrões de nomenclatura e boas práticas adotados no projeto.