Personalidade Vs Papéis Funcionais

Neste artigo é apresentada uma comparação entre as habilidades necessárias de alguns papéis funcionais descritos no Rational Unified Process (RUP) com as descrições dos papéis de comportamento em equipe da Teoria de Papéis de Belbin.

Por que eu devo ler este artigo: O objetivo é mostrar como a Teoria de Belbin pode ser utilizada para auxiliar na montagem de equipes de software. Desta forma, é possível montar equipes nas quais exista um melhor casamento entre o comportamento esperado no papel funcional e os comportamentos mais naturais do indivíduo alocado neste papel, impactando na produtividade e na motivação da equipe.

Formar boas equipes está longe de ser uma tarefa fácil, pois não se trata apenas de colocar pessoas altamente qualificadas para trabalhar juntas. Mas, uma vez que se consegue organizar as pessoas de acordo com suas personalidades e potenciais habilidades, a qualidade e a produtividade do trabalho desenvolvido podem ser melhoradas.

Desenvolvimento de software é uma atividade reconhecidamente complexa devido ao grande e diverso conjunto de fatores que podem afetar o desempenho e, consequentemente, o sucesso dos projetos. Entre estes fatores estão os aspectos essencialmente técnicos (linguagens, dispositivos, métodos de produção, processos de desenvolvimento, etc.), o conhecimento (ou não) do domínio do negócio, a qualificação técnica da equipe e a forma como as pessoas envolvidas interagem, se estruturam e se comportam diante das atividades do projeto de desenvolvimento. O último destes fatores está relacionado diretamente à composição do time (de desenvolvimento) de software, como discutido por Sawyer (2004).

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A equipe de software tem sido estudada desde os primeiros dias da engenharia de software, em trabalhos seminais como Baker (1972) ou Brooks (1976). Estes enfoques essencialmente funcionais têm sido complementados, mais recentemente, com análises da influência do tipo de personalidade dos indivíduos no desempenho da equipe de software. Estes novos trabalhos têm buscado sua fundamentação conceitual em estudos e teorias sobre tipos de personalidade (por ex. Bradley & Herbert (1997)), teoria de papéis (por ex. Biddle (1979) e Belbin (1981)) ou estilos cognitivos (por ex. Kirton & Ciantis (1986)), entre outros.

Os resultados de vários autores, entre eles Gorla & Lam (2004), Rajendram (2005), Young et al. (2005) e Karn & Cowling (2006), apresentam evidências concretas de que certas personalidades têm melhor desempenho em determinados papéis do processo de desenvolvimento. Ou seja, conclui-se que um caminho para melhorar o desempenho de equipes de software é buscar o adequado casamento entre papel funcional ou técnico com a personalidade do indivíduo atribuído ao papel.

No entanto, todos conhecem histórias de equipes formadas apenas por estrelas (ótimos profissionais) e que não conseguiram um bom entrosamento, não renderam o esperado ou até mesmo falharam. Assim como o oposto, equipes desacreditadas, com participantes menos qualificados, obterem ótimos resultados. Isso acontece em diversas áreas, desde esportes e pesquisa até no mundo empresarial. Formar boas equipes está longe de ser uma tarefa fácil, pois não se trata apenas de colocar pessoas altamente qualificadas para trabalhar juntas. Mas, uma vez que se consegue organizar as pessoas de acordo com suas personalidades e potenciais habilidades, a qualidade e a produtividade do trabalho desenvolvido podem ser melhoradas (Ferreira, 2007).

Neste artigo é apresentada uma comparação entre as habilidades necessárias de alguns papéis funcionais descritos no Rational Unified Process (RUP) com as descrições dos papéis de time da Teoria de Papéis de Belbin (1981). O objetivo é identificar como a Teoria de Belbin pode ser utilizada para auxiliar na montagem de equipes de software nos quais exista um melhor casamento entre o comportamento esperado no papel funcional e os comportamentos mais naturais do indivíduo alocado neste papel.

Papéis de Time (Team Roles)

Segundo Belbin (1981), dentro de um contexto de trabalho em equipe todo indivíduo pode ser classificado de acordo com os seus conhecimentos e a sua função técnica e também com a forma como tende a se comportar, a contribuir e a se relacionar com outros integrantes. Para tanto, Belbin construiu um conjunto de Team Roles, ou papéis de time, que descrevem padrões que caracterizam o comportamento de um indivíduo em relação aos outros na facilitação do progresso de um time.

No estudo de Belbin, são identificados cinco princípios para o gerenciamento de times:

Criar um time forte e coeso é uma ciência inexata. Existem coisas que podemos fazer para aumentar as chances de serem bem-sucedidos, mas é impossível dizer se o time realmente vai se sair bem. Trazer as pessoas certas para o projeto se torna crucial. Entretanto, não basta apenas entender como o indivíduo se comporta sozinho e sim, como ele interage em um determinado grupo. Não se trata de ter a pessoa certa para liderar, mas sim, pessoas capazes de trabalhar bem em conjunto e que possam se ajudar para alcançar um objetivo em comum.

Por tratar de aspectos pessoais não-estáticos, relativos ao comportamento situacional dos indivíduos, Belbin complementa que é possível um único indivíduo assumir mais de um papel na equipe, desde que não sejam papéis com características chocantes. Dessa forma, não é necessário que uma equipe tenha ao menos oito componentes para suprir todos os perfis.

Em seu trabalho original, Belbin (1981) definiu oito papéis de time:

A Tabela 1 explora sucintamente as características típicas, as qualidades e as fraquezas de cada papel de time.

Papel de Time (Título Original) Sigla Descritores Pontos Fortes Possíveis Fraquezas
Completer Finisher CF Ansioso, consciencioso, introvertido, tem autocontrole, tem autodisciplina, submisso e preocupado. Meticuloso, consciencioso, procura por erros e omissões, entrega sem atraso. Tendência a se preocupar demais. Relutante a delegar.
Implementer (Company Worker) IMP Conservador, controlado, disciplinado, eficiente, inflexível, metódico, sincero, estável e sistemático. Disciplinado, confiável, conservador e eficiente, transforma ideias em ações práticas. Um tanto inflexível. Lento para responder a novas possibilidades.
Team Worker TW Extrovertido, amigável, leal, estável, submisso, confortante, não assertivo e não competitivo. Cooperativo, suave, boa percepção e diplomático, escuta, constrói, evita atritos, acalma o clima. Indeciso em situações de conflito.
Specialist [Nota 1] SP Especialista, defensivo, não interessado nos outros, sério, tem autodisciplina, eficiente. Focado, dedicado, automotivado, provê conhecimento e habilidades raras. Contribui somente em um único tópico. Alonga-se em tecnicalidades.
Monitor Evaluator ME Seguro, fidedigno, justo, introvertido, de avanço lento, aberto a mudanças, sério, estável e sem ambições. Sóbrio, estratégico e perspicaz, visualiza todas as opções, julga com precisão. Não tem impulso e habilidade para inspirar outras pessoas.
Coordinator (Chairman) CO Dominante, confia nos demais, extrovertido, maduro, positivo, tem autocontrole, tem autodisciplina, estável. Maduro, confiante, bom diretor, esclarece objetivos, promove a tomada de decisão, delega bem. Pode ser visto como manipulador. Sobrecarregado com trabalho.
Plant PL Dominante, imaginativo, introvertido, original, pensamento radical, cheio de confiança, não se inibe. Criativo, não ortodoxo, soluciona problemas difíceis. Muito absorto em pensamentos; dificuldade para se comunicar efetivamente.
Shaper SH Abrasivo, ansioso, arrogante, competitivo, dominante, irritável, emocional, extrovertido, impaciente, impulsivo, autoconfiante. Desafiador, dinâmico, prospera sob pressão, tem impulso e coragem para vencer obstáculos. Suscetível a provocações. Ofende o sentimento das pessoas.
Resource Investigator RI Diplomático, dominante, entusiasta, extrovertido, flexível, inquisitivo, otimista, persuasivo, positivo, descontraído, social e estável. Extrovertido, comunicativo, explora oportunidades, desenvolve contatos. Excessivamente otimista. Perde interesse depois do entusiasmo inicial.
Tabela 1. Papéis de Time, Descritores, Pontos Fortes e Possíveis Fraquezas - Fonte: Belbin (1993), pg. 22
Nota 1: O Papel Specialist foi acrescentado ao conjunto de papéis de Belbin em seu trabalho mais recente (Belbin - 1993). Porém, este papel tem sido criticado na literatura e sua validade não é clara neste contexto. Portanto, este trabalho baseou-se na versão original (Belbin - 1981) e, por isso, não trata o papel Specialist.

Os papéis de time podem ser agrupados de acordo com sua tendência em relação à liderança ou criatividade, da seguinte forma:

A Teoria de Papéis é complementada por uma ferramenta de análise chamada Team Role Self-Perception Inventory (TRSPI, Belbin (1981), pg. 153), com o qual é possível identificar os papéis exercidos ou preferidos por um indivíduo em uma situação de trabalho em grupo. O TRSPI (versão original com 8 papéis) é composto de 7 questões, com 8 itens por questão. Cada item descreve um comportamento relativo a uma situação de trabalho em grupo e está relacionada a um papel de time. O respondente deve atribuir 10 pontos entre os 8 itens em cada questão, de forma a refletir a sua autopercepção de como se comporta em cada situação descrita.

As pontuações não são utilizadas diretamente. Existe uma tabela de normas que classifica a tendência ao comportamento de acordo com o papel em uma escala de quatro valores: Low, Average, High e Very High. Com esta escala, indivíduos com pontuação nos níveis High e Very High tendem a exibir o comportamento descrito no papel, enquanto aqueles com pontuação Low ou Average terão deficiência ou dificuldades em assumir o comportamento descrito.

Adequação de perfis de personalidade e papéis funcionais do RUP

As recomendações abaixo foram desenvolvidas a partir de uma pesquisa de campo realizada através da aplicação de uma adaptação do questionário Self Perception Inventory - SPI em 40 profissionais distribuídos em três fábricas de software com atuação em Recife.

A Tabela 2 apresenta o mapeamento sumarizado entre todos os papéis do RUP e seus perfis adequados do Belbin.

IM CO SH PL RI ME TW CF
X X Analista do Processo de Negócios
X X X Analista de Sistemas
X Analista de Teste
X X Arquiteto de Software
X X Designer
X X Designer de Banco de Dados
X X Designer de Cápsulas
X X Designer de Interface de Usuário
X X Designer de Negócios
X X Designer de Teste
X Engenheiro de Processo
X X Especificador de Requisitos
X Gerente de Configuração
X Gerente de Controle de Mudanças
X Gerente de Implantação
X Gerente de Projeto
X Gerente de Testes
X X Implementador
X Integrador
X Revisor de Arquitetura
X Revisor de Código
X Revisor de Design
X Revisor do Modelo de Negócios
X Revisor do Projeto
X Revisor de Requisitos
X Testador
Tabela 2. Mapeamento dos perfis de Belbin nos Papéis do RUP

Recomendações gerais para montagem de times

Com base na análise das adequações descritas anteriormente, é possível delinear as seguintes recomendações gerais para montagem de times:

Considerações Finais

Tanto a literatura recente de gerenciamento de projetos quanto a literatura da psicologia indicam que existe uma relação positiva entre a adequação do perfil pessoal ao papel funcional e o desempenho do indivíduo na função (Bradley & Herbert, 1997). Ou seja, pessoas tendem a ter melhor desempenho quando estão realizando funções que combinam com seu comportamento natural.

Sendo assim, para os gerentes de projetos, estas recomendações para a alocação de pessoas nos papéis do RUP servem como uma poderosa ferramenta para melhorar diversos aspectos da composição de times de software além de complementar os processos de seleção de pessoal e montagem de times.

Referências:
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  • Aritzeta, A., Swailes, S. and Senior, B., (2005) “Team Role Preference and Cognitive Styles". Small Group Research, Vol. 36, No. 4, 404-436.
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  • Belbin, M.R. (1993) “Team Roles at Work”, Elsevier Butterworth-Heinemann Ltd.
  • Biddle, B.J. (1979) “Role theory: Expectations, identities, and behaviors”. New York: Academic Press.
  • Bradley, John H. and Herbert, Frederic J. (1997), “The effect of personality type on team performance”, Journal of Management Development, Vol. 16, No. 5, pp. 337-353, MCB University Press.
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  • Ferreira, Henrique S. (2007) “Um Estudo Da Adequação De Personalidades E Papéis Na Metodologia Scrum De Desenvolvimento De Software”. Trabalho de graduação apresentado no Centro de Informática-CIn da UFPE.
  • França, A. César C. e da Silva, Fabio Q. B. (2007) “Um estudo sobre Relações entre Papéis Funcionais do RUP e o Comportamento Pessoal no Trabalho em Equipe em Fábricas de Software”. III Workshop Um Olhar Sociotécnico sobre a Engenharia de Software – WOSES.
  • Gorla, N. and Lam, Y.W., (2004). “Who Should Work With Whom? Bulding Effective Software Project Teams”. Communications of the ACM, Vol. 47, No. 6, pp. 79-82.
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  • Kruchten, P. (2003) Introdução ao RUP – Rational Unified Process, Rio de Janeiro: Editora Ciência Moderna Ltda.
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